quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Visitando buracos nas Pedras Salgadas


Enquanto no Palace Hotel de Vidago os velhos hóspedes ou os seus descendentes podem matar saudades fazendo à grande um check-in no novo velho Palace, nas Pedras Salgadas têm de se converter a um estilo mais moderno, minimalista e nórdico de veraneio, adaptando o velho esqueleto aristocrata a uma versão luxuosa do estilo Ikea: os bungalows ou eco houses que a Unicer providenciou para ali.
Não havia nas Pedras, dir-se-á, hotéis com o arcaboiço monumental do Palace de Vidago e as casas que a Unicer instalou são um exemplo de bom gosto e respeito pelo património ambiental. (Se não tivesse nascido a cinquenta metros do parque e ali não almoçasse aos domingos, decerto as minhas fantasias apocalípticas teriam já passado por fins-de-semana ecológicos acima das minhas posses no Nature Park das Pedras Salgadas.) Mas não se deve esconder que o saudosismo ou o ímpeto arqueológico de antigos hóspedes é ludibriado nas Pedras como o não é em Vidago.
O Universal, belíssimo exemplar, podia ser uma das jóias da coroa de qualquer empresa, mas definha, em parte irreversivelmente. O Grande Hotel está entaipado. O Avelames deu lugar a um embaraçoso morro de relva sob o qual se albergam os serviços de apoio às eco houses. No lugar do Hotel do Norte, onde havia até há pouco uma inverosímil clareira, há agora um court de ténis que Pires de Lima mandou concluir à pressa para Passos Coelho inaugurar. A Pensão do Parque desapareceu. O Bazar Fotográfico idem. Ali perto nas Romanas foi a Casa do Chá que se vaporizou subitamente (um domingo estava lá, no seguinte não estava).
O turismo de nostalgia nas Pedras faz-se, portanto, apontando buracos, clareiras, ocos. Como vi o neto de um velho hóspede, com uma criança pela mão, fazer há dias. «O bisavô dormiu ali em cima [Avelames] e o papá nos últimos anos dormiu aqui [Pensão do Parque]». “Aqui” é agora um parque infantil e a menina espreitou com suspeita ou ressentimento o pai: que direito tivera ele de pernoitar num baloiço que agora negava à filha?

O turista avisado mune-se de máquina fotográfica e acorre célere às Pedras. Quando volta, ou se se atrasa, já não encontra edifícios que antes pareciam fazer parte do ADN da terra, mesmo que em ruínas. Nem edifícios nem fundações, apenas vazios onde rapidamente cresce a erva.

A mim este confronto com inesperada arqueologia forneceu já matéria para um romance e em parte para outro. Mas o mundo passava melhor sem os meus livros do que sem as termas das Pedras Salgadas.

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